domingo, 12 de outubro de 2014

sorte pior

há um distúrbio
em meus olhos
aprisionado nas retinas
condenando-me a ilusão perpétua
de ver as coisas
além do que elas não são
há um dilúvio
em meu peito
pronto pra rebentar as comportas
a espera de um buraco de bala
última gota num copo d’água
prestes a transbordar
há um reduto
em minha mão direita
onde despejo
a minha inconformidade
e isso talvez, seja o que me salve
de uma sorte um pouco pior

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

sem anestesia

encontro a dor na pia
com as mangas umedecidas
e um corte no supercílio direito

deixo-me sangrar na pia
com os olhos esbugalhados
e uma dor que atravessa o peito

eu vejo escorrer na pia
toda a anestesia que permitiu
o meu enfrentamento 
diante daquele 
que é o meu maior defeito

lutar pelo que não tem jeito

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

azul turquesa

tudo continuava ali
as paredes manchadas
o pedaço de reboco
que caiu na entrada do corredor
as fotografias amareladas
os mesmos quadros
a garagem ainda alugada
para uma oficina de bicicletas
os quartos interligados
por portas que chegavam ao teto
o poço artesiano coberto
por uma espessa camada de concreto

tudo continuava ali
as janelas que davam pra rua
o fogão que alimentava a cozinha
o rádio que a escutava
a cama onde sonhava
e o quintal que iluminara os seus dias

quando resolveu partir