terça-feira, 24 de março de 2015

olho da rua

o olho da rua
não vê o menino
que dorme sozinho
no frio do abandono
a boca da noite
mastiga sua vida
engole as saídas
e cospe seus sonhos
o olho da rua
não pisca pra sorte
não chora com a morte
não fecha na esquina
é olho da rua
por olho de gente
que segue passando
pisando por cima

segunda-feira, 23 de março de 2015

gatos-pingados

observando cães raivosos
e desequilibrados
que assumiram ter comido o próprio rabo
pra matar a fome

perfilados com os mesmos ratos
defensores das cortinas de concreto
e dos porões

quarta-feira, 18 de março de 2015

à margem

Jack sabia
que o vento cortava
mas não projetava
um lugar pra ficar
Allen alertava
que a queda viria
mas não pretendia
ficar na pior
Charles queria
corrida e sossego
viver feito um bêbado
num quarto de hotel
James sorria
e amontoava cadáveres
sob tempestades
de alto teor

domingo, 15 de março de 2015

vida e seca

à sombra de uma figueira
lendo Graciliano
um bando de cabras pastando
e o pó fino da poeira
não chove a mais de meio ano
não bebo desde sexta-feira
nem torço mais pelo engano
de ser feliz com vidas secas

à sombra de um juazeiro
olhando para a mangueira
flertando com a morte certeira
que apaga o verde do sonho
não há mais o que aconteça
esperar é trágico e desumano
chover não faz parte da seca
viver não faz parte dos planos